São Paulo em Imagens

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Paralelas

(Texto publicado originalmente em blog interno do Banco do Brasil)

Ela acordou cedo, ou nem dormiu, na verdade. Já fazia um mês que o namorado terminara com ela, e todas as noites eram a mesma coisa, um alternar interminável entre sono aos sobressaltos e estar acordada, chorando.
Levantou-se, sabendo que estar na cama não a ajudaria em nada. Ao contrário, o melhor a fazer seria ajudar sua mãe com os afazeres para aquele dia, concluindo logo suas tarefas, antes do horário combinado com a amiga. Era o dia do aniversário da cidade, havia uma extensa programação comemorativa, e as duas haviam combinado há dias que iriam participar.
“Vai ser bom”, ela tentava convencer-se, “ao menos vai ser tanta coisa a fazer que nem vou me lembrar do Renato”.
A amiga chega por volta das 11horas. Saem imediatamente, uma longa viagem de ônibus até o centro da cidade. E, com o feriado, é muita sorte se o ônibus demorar menos de uma hora a passar...
Ele acordou tarde. Havia acordado antes, olhou o dia nublado pela janela e voltou a dormir. Era feriado, não precisava acordar cedo, afinal de contas. Pretendia participar da programação de aniversário da cidade, mas não tinha pressa alguma.
Levantou-se por volta do meio-dia. Toma um banho sem pressa e sai caminhando, em direção ao evento mais próximo.
Ela esperava um show melhor. Para tentar animar-se, divide com a amiga uma garrafa de vinho barato, comprado do ambulante a um preço que, definitivamente, não valia.
O show está animado, mas ele não compreende a razão de ter sido contratada uma banda de fora da cidade, com tantas bandas locais disponíveis.
Enquanto ele ouve as músicas, passeia pelo local. Apesar de tantos anos vivendo na cidade, esta é a primeira vez que consegue ir a um evento deste tipo.
Enquanto ouve as músicas, ela e a amiga dançam, pulam e bebem. Tudo é válido, para esquecer a dor que sente.
Terminado o show, ele dirige-se a um pequeno restaurante próximo, para uma refeição simples, mas que seja diferente de sua comida de todos os dias. Ela busca uma das muitas barracas que há no local, vendendo cachorros-quentes e outros lanches, para comer algo.
Depois da refeição, percebendo a chuva que se aproxima, ele volta para casa, sem pressa em assistir o show que vai começar no final da tarde. Ela e a amiga tentam o abrigo de uma marquise, mas a quantidade de pessoas que teve a mesma ideia não lhes permite grande sucesso.
As duas dividem mais uma garrafa de vinho para se esquentarem. E depois outra, para se alegrarem, ou comemorarem, ou esquecerem, o motivo já não mais importa. Enquanto elas bebem, ele dorme.
Começa o show, e dançando, em meio à aglomeração popular, elas nem se lembram mais do tanto que se molharam. E, em breve, as próprias roupas já estão bastante secas.
Por alguns instantes, ele questiona-se a respeito de sair novamente de casa. Acaba se convencendo de que ir é melhor que suportar o opressor sentimento de solidão que preenche todo o local.
Ela e a amiga afastam-se um pouco do palco principal e da agitação que o cerca, optando por acompanharem o show pelo telão. A imagem é ruim, mas não faz muita diferença, pois o que menos interessa é ver o que acontece no palco. O momento é para beber, dançar e esquecer.
Ele, ao contrário, prefere aproximar-se do palco, encantado pela novidade. Tantos anos, tantos shows que já perdera, constata agora um ambiente muito mais tranquilo do que sempre ouvira falar.
Não falta muito tempo para o final previsto do show, ele decide afastar-se do palco, de modo a ter menos problemas quando for para sair.
É neste momento que as paralelas se encontram.
Basta uma breve fração de segundo. Ela dança, ele caminha. Os olhos dos dois se conectam. No palco, a música que se transformou no hino extraoficial da cidade. Não é preciso usar palavras. Ele estende a mão, ela a segura. Ele a puxa para si. Abraçados, dançam, esquecendo-se de tudo e de todos. Trocam algumas palavras, ele pergunta o nome dela. “DÉni”, ela responde, forçando um falso sotaque inglês. Não pergunta o nome dele, nem ele diz.
A música termina, e também a dança. Um breve beijo no rosto, “obrigado por estes momentos”.
E as paralelas voltam a se desencontrar.

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